sexta-feira, 25 de abril de 2014

"Para Leopoldina" destaca-se no lançamento dos curtas do II Edital da Secult

O Teatro Atheneu estava completamente lotado, na noite de ontem, por ocasião do lançamento dos cinco filmes contemplados pelo II Edital de Apoio à Produção de Obras Audiovisuais Digitais de Curtametragem da Secretaria de Estado da Cultura (Secult).

Com apenas meia hora de atraso, a cerimônia começou com um breve pronunciamento da secretaria de Estado da Cultura, Eloísa Galdino e, depois do apagar das luzes, o  público pode conferir na sequência: "Conflitos e Abismos" de Everlane Moraes; "Morena de Olhos Pretos" de Isaac Dourado; "M.A.D.O.N.A" de André Aragão; "Para Leopoldina" de Diane Velôso e Moema Pascoini e "Operação Cajueiro- um carnaval de torturas" de Fábio Rogério, Werden Tavares e Vaneide Dias.

Dos cinco filmes exibidos, conferi, previamente, o híbrido doc-animação de Everlane Moraes e a ficção dirigida pela dupla Velôso-Pascoini. Minhas impressões iniciais sobre esses  filmes, pouco mudaram depois de uma segunda exibição. Continuo gostando pouco do primeiro e muito do segundo. Explico.

Everlane Moraes arriscou-se ao realizar um filme-homenagem ao pai e artista plástico, José Everton Santos, tendo em vista que o deixa a vontade demais, para guiar a narrativa em off. Não há um momento, sequer, de interferência da diretora e o resultado torna-se, por vezes, enfadonho. O discurso do pintor não se sustenta ao longo da duração do curta e, ainda que as fusões das suas telas com as cenas animadas, dê um certo alívio ao espectador, não é suficiente para salvar a produção.

A jovem realizadora do ótimo documentário "Caixa D'Água- Qui- lombo é Esse?" e experiente diretora de arte, dessa vez não acertou o alvo, mas nem por isso, precisa desanimar. Foi corajosa na sua escolha e o bom senso que lhe é peculiar, com certeza  a levará à concepção de projetos mais bem delineados.

"Para Leopoldina", no entanto, destaca-se pelo apuro estético. Levando-se consideração que Velôso, praticamente, está em cena em todo filme, deduz-se que Pascoini teve uma maior liberdade para compor os planos e experimentado ao longo das filmagens, já que também "controlou" a luz.  Técnica em Direção de Fotografia e Documentarista pelo Centro e Formación Profesional Del Sindicato de la Industria Cinematográfica Argentina (C.F.P-SICA), Moema Pascoini já mostrou seu talento em outros trabalhos locais, sempre como diretora de fotografia.

Agora, alçou voos mais altos e não despencou da planagem. Usando alguns planos sequências bem apropriados, primando pelo minimalismo e naturalismo, a diretora conseguiu um resultado bem acima da média, em relação a outros curtas locais. É bem verdade, que se houvesse um tempo maior para a preparação das atrizes principais, provavelmente, o desempenho de ambas teria sido bem melhor.

Longe de questionar o talento individual de Diane e Walmir Sandes, parece que em cena, as duas não conseguiram afinar seus desempenhos. Quando o espectador espera o ponto alto do arco dramático (a conversa das duas no corredor do asilo), o clímax se afrouxa e a frustração substitui a satisfação. Engraçado que para um filme que aborda a solidão, o perdão, o vazio, ele é  pouco sentimental. Falha no roteiro ou na mise en scène ?

Ainda assim,  alcança um lirismo em determinados momentos, como a cena final e a que a câmera desce num travelling vertical do tronco de uma árvore até o rosto (em close) de Leopoldina (Sandes). Ponto também para a trilha sonora de Alex Sant'Anna e Leó Airplane pontuando a atmosfera melancólica que reveste a vida de Lúcia (Velôso). E o que dizer da coruja (figurante) que nos brinda com um pouso surpreendente nos últimos minutos de projeção???

Pena que os elogios parem por aqui. Tendo em vista que o documentário "Operação Cajueiro" não inova em nada no seu formato calcado em depoimentos (plano fixo dos entrevistados). Nada de zoom in, de eventos encenados, de utilização de imagens de arquivo (excetuando-se o uso no início e final do curta), de performance dos diretores.

Um documentário "chapado", que pelo tema que aborda, poderia ter sido mais contundente na sua proposta. Aliás, fiquei esperando uma trilha mais adequada e a reportagem publicada no jornal A Tarde (BA) sobre a Operação, ser mostrada. Sobrou depoimentos e faltou uma pesquisa mais aprofundada de material de acervo da época.

Aliás, parece que esse mal perpassou a produção de "Menina de Olhos Pretos" que pretendia homenagear Clemilda, mas parece, que no meio do caminho, havia o forró para reverenciar. O curta até que começa bem, com o áudio de uma entrevista concedida pela forrozeira ao compositor João Melo, enquanto as marcas de patrocinadores e apoiadores ainda enchem a tela.

Seguem-se imagens do último show da cantora alagoana, radicada em Sergipe, no Forró Caju 2012. A partir daí, o roteiro se confunde, não sabendo no que mirar: se na vida e trajetória artística de Clemilda ou se no gênero forró, desfilando um time de representantes desse estilo musical, como Erivaldo de Carira, Alcymar Monteiro, Jorge de Altinho, Anastácia e Josa, o Vaqueiro do Sertão.

O diretor Isaac Dourado até ensaia entrar no 'ritmo do pé de serra', quando entrevista o pesquisador Paulo Correia, que explica o início da carreira do sanfoneiro Gerson Filho e seu envolvimento, posterior, com Clemilda, a quem iria lançar nacionalmente. Mas quando lembro da participação efetiva  de Augusto Barreto no curta, sem nenhuma menção do seu trabalho com a cantora na produção do Programa Forró no Asfalto; da ausência de uma imagem sequer desse importante programa televisivo sergipano e da cena final, mostrando o cantor Josa, num estado um tanto crítico, fisicamente, não dá para salvar muita coisa.

Temo que Genival Lacerda ao assistir a esse filme, não encontre ainda, a homenagem tão merecida, que ele almeja para a amiga Clemilda. Por enquanto, deixou a desejar...

Difícil também apreciar a ficção "M.A.D.O.N.A" de André Aragão. O diretor já havia derrapado feio com seu curta de estreia "Xandrilá" e não soube aproveitar a oportunidade do I Edital da Secult, para fazer algo melhor do que o resultado alcançado no documentário "Hotel Palace".

Aqui, ele volta à ficção (ainda que baseada num caso real), mas os problemas do primeiro filme, fazem-se presentes: estilização desnecessária da violência, interpretações exageradas e pouco convincentes e uma estética decadente, um tanto fake.

Confesso que estava curiosa para ver a construção da personagem título por Ivo Adnil, mas decepcionei-me com tom over seja na interpretação, seja na caracterização. Madona estava longe de ser uma "Carmen Miranda" com seus balangandãs, ainda que rodopiasse como uma baiana ensandecida pelas ruas centrais da capital sergipana. 

Teve o azar de numa de suas andanças noturnas, deparar-se com homofóbicos munidos de um taco de beisebol (arma clichê nos filmes policiais norte americanos, que aqui não sei qual o propósito), que a violentaram e desfiguraram até a morte. Aliás, uma falha terrível do roteiro: o rosto de Madona deveria estar desfigurado depois de tanta pedrada, não? E porque não estava desfigurado, dá condição de sua amiga reconhecê-la, mesmo no escuro e a uma certa distância ?

Após esse breve balanço, só posso desejar aos realizadores que aprendam com as falhas e se aprimorem nos próximos projetos. E que a Secult não desista de investir no audiovisual local. Ainda que ele esteja, apenas, dando os seus primeiros passos.


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