domingo, 16 de setembro de 2018

51o Festival de Brasília (Segundo Dia)- "Torre das Donzelas"


51o Festival de Brasília_Suyene Correia_http://bangalocult.blogspot.com

Apresentação de "Torre das Donzelas" no Cine Brasília 
51o Festival de Brasília_Torre das Donzelas"_http://bangalocult.blogspot.com
Susanna Lira apresenta as ex-presas políticas ao público
51o Festival de Brasília_foto Suyene Correia_http://bangalocult.blogspot.com
Lira e algumas das militantes políticas após o debate de "Torre das Donzelas"

Pode-se dizer que a 51a edição do Fest Brasília começou, de fato, ontem, com as exibições de "Torre das Donzelas" de Suzanna Lira e "Los Silencios" de Beatriz Seigner (leia mais sobre esse filme, na próxima postagem). Isso, porque, apesar de ser o primeiro dia de Mostra Competitiva, devido à aclamação dos espectadores, após a exibição do documentário da carioca Lira, ouso arriscar que o Prêmio de Público para o Melhor Filme dessa edição do festival já tem destino certo.

O filme foi aplaudido, não só durante a sua projeção (em pelo menos quatro ocasiões, que eu me recorde), como também ao final, principalmente, quando as fotos de cada uma das 25 ex-presas políticas foram surgindo, com informações que as identificavam.  O plus é que boa parte dessas mulheres aguerridas estavam na plateia, assistindo pela primeira vez a essa produção de formato ousado e criativo. Foi uma sessão emocionante e, mais do que isso, reveladora.

Susanna Lira conseguiu extrair depoimentos potentes das ex-companheiras de cela da Torre das Donzelas -parte do Presídio Tiradentes, demolido em 1972- que abrigavam presas políticas. Histórias que foram silenciadas há mais de quatro décadas e que vieram à tona, há alguns anos, quando a documentarista de longas como "Clara Estrela" (2017), "Damas do Samba" (2015), "Positivas" (2010), foi ao encontro de Rita Sipahi, conselheira da Comissão da da Anistia.

Se, no início, Sipahi viu com descrença o projeto de Lira, ao se reunir com ela e outras ex-colegas de prisão, a confiança foi sendo conquistada e, não tardou, para a fase de entrevistas começar. "Eu fui colhendo depoimentos das mulheres ao longo de um tempo, conversas que duravam três, quatro horas. Numa terceira fase, conduzi as filmagens num estúdio em São Paulo, onde foi montado o cenário, simulando interior da Torre, a partir das descrições do ambiente por cada uma delas", explica a diretora.

Tendo como uma de suas referências, "Dogville" de Lars Von Trier, a documentarista juntamente com a diretora de arte, Glauce Queiroz,  reconstituíram o interior da Torre, o mais fielmente possível. O resultado foi exitoso, tendo o cenário funcionado como uma instalação-dispositivo da memória. "O cenário ficou montado durante 10 dias e consumiu boa parte do orçamento. Fizemos questão de reproduzi-lo, porque apostamos no efeito emotivo que ele poderia causar nas entrevistadas. Também foi o momento de reencontro de muitas delas, que não se viam há tempos. Penso que a fala das testemunhas precisava ser valorizada pelo ambiente, daí porque minha preocupação com esse conceito", diz Lira.

O documentário opta por uma estrutura de docudrama, onde um grupo de jovens atrizes voluntárias, aparecem, ocasionalmente, em situações similares a que as ex-presas viveram no passado. Essas cenas são intercaladas por depoimentos das militantes em estúdio e na "Torre" cenográfica. Segundo Susanna Lira, esse artifício serviu não só para auxiliar no desenvolvimento narrativo, mas também foi importante ao fazer com que as jovens tomassem consciência de uma parte da nossa história, vivenciando-a, ainda que nunca tenham se encontrado com "as donzelas".

Entre as depoentes estão a ex-presidenta Dilma Roussef (concedeu a entrevista, pouco tempo antes do Impeachment), Dulce Maia, Rita Sipahi, Ana Miranda, Ilda Martins da Silva,  Marlene Soccas,  Rose Nogueira e Iara Prado. São relatos que ainda chocam pelo horror de certos detalhes, mas o grande trunfo do filme é se afastar da armadilha do vitimismo. As ex-presas souberam transformar a "Torre" numa extensão de casa e usaram a alegria e a sororidade como forma de resistência. Quando poderíamos imaginar, que num ambiente hostil como o cárcere, poderia haver um desfile de modas e um baile carnavalesco?   

Outros pontos de destaque são a direção musical assinada por Flávia Tygel e a mixagem de Bernardo Uzeda. Há um cuidado todo especial com o desenho de som que nos transporta para um ambiente carcerário real. A organicidade desse componente dá-se pelo fato da captação de muitos dos ruídos gravados, serem oriundos de um presídio feminino de Pernambuco. As sequências em que são entoadas pelas mulheres "A Internacional Comunista" e a "Suíte dos Pescadores" de Dorival Caymmi são comoventes.

Pela sua potência artística e política, "Torre das Donzelas" mostra-se como um forte candidato a levar "Candangos" para casa. Aguardemos!!

Assista ao trailer:



2 comentários:

Unknown disse...

Quero muito assistir. Pelas matérias que li e assisti, está aula de história é imperdível! Parabéns pela iniciativa.

Bangalô Cult disse...

Obrigada. Continue acessando o blog que tem mais novidades sobre os filmes do 51o Festival de Brasília.